Este imenso género musical, para além da sua componente harmoniosa do que chega aos nossos ouvidos, tem também uma vertente social bastante vincada. Inúmeros historiadores, sim, historiadores, já fizeram incursões por esses extensos labirintos que o samba abiru na sociedade brasileira. Não raras vezes ele foi apontado ao advento das classes mais baixas e pobres, que por via do seu talento, se destacava desta forma, transportando estas capacidades para as ruas cariocas. Se a denominada MPB ( Música Popular Brasileira) teve impulso através do samba, muitas vezes, amistosamente relacionada também com a bossa nova e o jazz, não é menos verdade que foi o samba a ancorar um país adormecido e, através dele, a lançar um verdadeiro grito do Ipiranga contemporâneo perante a ditadura militar...Pelas suas letras, os sentimentos eram transmitidos e funcionava sempre como um impulso e uma esperança no futuro. Muitos são os compositores que deixaram a sua marca neste contexto social complicado e censurado, aliás, algo que é transversal a vários países de diferentes hemisférios.
É um facto, intransmissível, que enveredar pelo estudo do samba pode levar a variadas conclusões e até a diferenças de opinião. Há situações que não estão registadas e os anos marcaram a distância dos acontecimentos. Mas não deixa de ser encantador estudar todo o seu movimento e toda a história que demandou desde a casa da Tia Ciata, daí a origem baiana do ritmo e da sua origem vir da dança e da influência negra. Também interessante a centralidade da Praça Onze em todo o seu crescimento, bem como as tertúlias à volta de instrumentos e das palmas, dentro de casa ou no quintal. Pixinguinha foi um dos seus maiores expoentes na época. O samba era conotado com estas faixas sociais, com quem se relacionava ao mesmo tempo a rebeldia, sendo, por isso, quase desprezado e criminalizado. Estes encontros seriam, então, feitos na clandestinidade. Portanto, era comum a debandada da polícia a casa de Tia Ciata para fazer os devidos reparos. E foi neste tipo de ambiente que Donga criou o seu "Pelo telefone", considerado por todos como o primeiro samba a surgir na esfera musical e a ser gravado para a posteridade.
O samba sacrificou-se, foi perseguido, mas resistiu, tendo seguido um rumo de carnaval de rua, ou seja, incorporou-se nas festividades carnavalescas e ganhou uma dimensão mais de acordo com a sua realidade, de música de massas, mas com qualidade e humildade. Foi neste contexto que se deu o crescimento dos blocos carnavalescos em Estácio e Osvaldo Cruz, e dos morros da Mangueira, Salgueiro e São Carlos no Rio de Janeiro. Como todos sabem, foi a génese das actuais escolas de samba e criadoras do gigantesco carnaval, cartaz turístico carioca. Paralelamente, neste crescimento, abriu-se a toda a sociedade carioca, aparecendo novos compositores e envolvendo toda a sociedade, como trajecto natural e revelador de toda uma cultura. Ao mesmo tempo, começava-se a transmitir sambas na rádio, espalhando por todos os cantos a qualidade de um estilo musical muito próprio e contagiante.
Após este nascimento e infância muito complicados, o samba progrediu, variou, mas estabeleceu-se de alma no grandioso Brasil, chegando além fronteiras, onde é também adorado por comunidades locais, não integrando obrigatoriamente cidadãos brasileiros. O pagode e a batucada ganharam espaço e são representantes altaneiros desta cultura brasileira.
Atendendo à história, à sua raíz , à perseguição de que foi alvo e à própria cultura que ele transmite, este samba combina com talento, amor, dedicação e humildade. Sente-se!Por mim falo. Mas nada mais se ambiciona, porque perante a sua dimensão, a sua riqueza e a sua estrutura, vale apenas sentar e...ficar!
Carlos Oliveira/ agosto de 2012
Carlos Oliveira/ agosto de 2012
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